Bancos querem tirar poder do INSS sobre juros do consignado e repassar ao CMN: entenda o que está em jogo

O setor bancário brasileiro está pressionando por uma mudança significativa no modelo de definição dos juros do crédito consignado para aposentados e pensionistas. A proposta busca retirar essa atribuição do INSS e do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) e transferi-la para o Conselho Monetário Nacional (CMN), composto pelos ministros da Fazenda, do Planejamento e pelo presidente do Banco Central.
A seguir, explicamos os principais pontos dessa disputa e os impactos potenciais para consumidores e o sistema financeiro.
O que é o crédito consignado do INSS?
O crédito consignado é um tipo de empréstimo em que o valor das parcelas é descontado diretamente da folha de pagamento ou do benefício previdenciário. Por ter baixo risco de inadimplência, essa modalidade oferece juros mais baixos que outras linhas de crédito pessoal.
Atualmente, o INSS aplica a taxa máxima recomendada pelo CNPS, que é composto por representantes do governo, sindicatos e associações — alguns dos quais estão sendo investigados por fraudes bilionárias relacionadas a descontos indevidos na folha de pagamento de aposentados.
Por que os bancos querem mudar quem define os juros?
Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), os juros definidos pelo CNPS não refletem a realidade macroeconômica nem os custos de captação dos recursos no mercado financeiro. Os bancos alegam que, com tetos tão baixos — atualmente em 1,85% ao mês — muitas operações deixam de ser viáveis, especialmente as de menor valor, destinadas a aposentados com renda mais baixa.
Essas operações estariam gerando prejuízos, já que o custo de captação (como a taxa DI) está em torno de 1,09% ao mês. Diante desse cenário, bancos vêm reduzindo a oferta de crédito consignado ou deixando de atender perfis considerados mais arriscados, o que pode forçar os consumidores a recorrerem a linhas de crédito mais caras e sem garantias.
O papel do Conselho Monetário Nacional (CMN)
A proposta do setor financeiro é que o CMN passe a ser o único órgão responsável por definir os tetos de juros do consignado — não só para beneficiários do INSS, mas também para servidores públicos federais e trabalhadores com acesso ao FGTS. A justificativa é que o CMN possui maior expertise técnica para tomar decisões baseadas em critérios econômicos e financeiros sólidos.
Além disso, os bancos argumentam que a Constituição e a Lei 4.595/1964 já conferem ao CMN a competência de regulamentar o sistema financeiro, o que incluiria a definição de taxas de juros.
O impacto das investigações de fraudes
O momento da proposta não é coincidência. O setor bancário aproveita o desgaste causado por escândalos recentes no CNPS — envolvendo fraudes em descontos de mensalidades de sindicatos e associações — para impulsionar a mudança.
Após decisões da Justiça e do Tribunal de Contas da União (TCU), o INSS suspendeu automaticamente novos descontos em folha relacionados a esses empréstimos, que agora só poderão ser reativados mediante autorização expressa do beneficiário.
Movimentação no Congresso: nova lei à vista?
Uma lei de 2003 atribui ao INSS a regulamentação dos procedimentos do consignado, mas não menciona explicitamente a definição de juros. Por isso, parlamentares ligados à Frente Parlamentar do Livre Mercado apresentaram propostas de emenda para transferir essa competência ao CMN.
O relator do projeto, senador Rogério Carvalho (PT-SE), ainda não se posicionou oficialmente, mas afirmou que pretende ouvir representantes dos ministérios, do Banco Central e demais órgãos envolvidos antes de concluir o texto.
O que dizem os especialistas e representantes do setor bancário?
Leandro Vilain, CEO da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), destaca que a intenção não é eliminar o teto de juros, mas garantir que ele seja definido por um órgão técnico. Ele afirma que a taxa ideal para o consignado do INSS estaria entre 2,10% e 2,15% ao mês — patamar considerado mais sustentável frente aos custos do sistema.
O que pode mudar para aposentados e pensionistas?
Caso o CMN passe a definir os tetos de juros, é possível que as taxas aumentem. Isso pode restringir o acesso de beneficiários de baixa renda ao crédito mais barato, especialmente se os bancos decidirem focar em operações de maior valor ou menor risco.
Por outro lado, a medida pode trazer maior estabilidade para o mercado de crédito consignado, ao evitar distorções que desincentivam a oferta por parte das instituições financeiras.