CAPACrédito e Cobrança

“Me empresta o cartão?”: um terço dos brasileiros faz dívida em nome dos outros

O avanço das fintechs e das contas digitais ampliou o acesso ao crédito, mas não eliminou as desigualdades que marcam o sistema financeiro brasileiro. Uma pesquisa da Serasa Experian, destacada pela Exame, revela que 28,7% dos brasileiros fizeram compras utilizando o nome de outra pessoa — quase um terço da população entrevistada. A forma mais comum é o uso do cartão de crédito de terceiros, praticado por 1 em cada 5 brasileiros.

Esse comportamento reflete principalmente pessoas que estão “invisíveis ao crédito formal”: em 2023, cerca de 35 milhões não tinham acesso a linhas de crédito convencionais ou histórico bancário válido .

Por que tanta gente ainda depende do nome do outro?

Apesar da ampliação dos canais de crédito nos últimos anos, como bancos digitais e crédito pessoal online, milhões de brasileiros seguem fora do sistema formal. Muitos têm o nome negativado, não têm conta em banco, ou simplesmente não possuem renda comprovada para aprovação em financiamentos, empréstimos ou mesmo no parcelamento de compras básicas.

  • 25% dos entrevistados afirmaram recorrer ao nome de alguém para fazer compras de supermercado;
  • 16,9% para compras voltadas aos filhos;
  • 14,6% para comprar presentes em datas especiais; e
  • 18,3% para pagar dívida já existente

A maioria (84,5%) declara que tem quitado as parcelas em dia, indicando que nem sempre se trata de mal pagamento, mas sim de falta de acesso formal ao crédito.

O risco oculto: quando a confiança se transforma em dívida

Em um país onde a informalidade financeira é regra para muitos, usar o nome de outra pessoa para contratar um serviço ou fazer uma compra é visto, muitas vezes, como um “favor de confiança”. Mas quando o combinado não é cumprido — e o pagamento não é feito — a pessoa que emprestou o nome acaba com o nome sujo, dívidas acumuladas e prejuízos emocionais.

Casos comuns incluem:

  • Parcelamento de celulares ou eletrodomésticos no cartão de outra pessoa;
  • Empréstimos feitos por terceiros no CPF do “amigo” ou parente;
  • Contas de luz, telefone e streaming em nome de alguém que não é o usuário final.

Esse tipo de situação pode abalar relações familiares, comprometer amizades de anos e até gerar processos judiciais.

Exclusão financeira e baixa educação financeira: um ciclo perigoso

Esse fenômeno escancara dois grandes problemas estruturais no Brasil:

  1. Exclusão financeira: milhões de pessoas não têm acesso a crédito formal, ou o acesso se dá em condições abusivas (altos juros, garantias exigidas, etc.).
  2. Falta de educação financeira: muitos ainda não compreendem os riscos de emprestar o nome ou o cartão a terceiros, nem os impactos de um CPF negativado no dia a dia (dificuldade de conseguir emprego, crédito, alugar imóvel, etc.).

Enquanto esses dois fatores não forem enfrentados de forma estruturada, comportamentos como esse continuarão comuns — e seus efeitos, devastadores.

O impacto invisível no score de crédito

Uma das consequências mais sérias de assumir uma dívida de terceiros é a queda no score de crédito. Mesmo que a dívida não tenha sido feita para uso próprio, o CPF da pessoa que emprestou o nome será penalizado em caso de inadimplência.

Com isso, as oportunidades de crédito para essa pessoa diminuem. Isso afeta não só o acesso a empréstimos, mas também a contratação de planos, financiamentos imobiliários, veículos e até a participação em concursos públicos ou vagas de emprego, em alguns casos.

Como se proteger?

Seja por bondade, por falta de opção ou por pressão emocional, muitas pessoas acabam cedendo. No entanto, alguns cuidados podem evitar problemas maiores:

  • Evite emprestar o nome ou o cartão, mesmo para pessoas próximas;
  • Se for inevitável, formalize o acordo por escrito, com prazos e valores definidos;
  • Monitore seu CPF com frequência para detectar movimentações estranhas;
  • Converse abertamente com familiares sobre finanças e incentive a autonomia financeira.

O papel das empresas e do Estado

Mais do que um problema individual, esse comportamento sinaliza a necessidade de ações coletivas. Empresas financeiras, fintechs, governo e instituições de crédito precisam atuar em duas frentes essenciais:

  • Expandir o acesso ao crédito de forma segura e com juros justos, especialmente para quem está fora do sistema bancário;
  • Investir em educação financeira de base, desde o ensino fundamental até campanhas públicas de conscientização.

Conclusão: quando o favor vira dívida

A frase “me empresta o cartão?” parece inofensiva — mas pode esconder uma bomba-relógio financeira. A prática de contrair dívidas em nome de outra pessoa revela não apenas vulnerabilidades individuais, mas problemas estruturais de acesso ao crédito, exclusão bancária e desinformação financeira no Brasil.

A solução passa por uma mudança de cultura: criar uma relação mais saudável com o dinheiro, fortalecer o crédito responsável e garantir que ninguém precise mais usar o nome de outro para tentar sobreviver financeiramente.

Redação Contraponto

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