Banco do Brasil endurece crédito e ameaça banir produtores rurais que pedirem recuperação judicial
A instituição, maior financiadora do agronegócio brasileiro, adota postura mais rígida diante do aumento da inadimplência e da crise no setor

O Banco do Brasil (BBAS3), principal fonte de crédito do agronegócio nacional, anunciou que pode suspender definitivamente novos empréstimos a produtores rurais que entrarem com pedido de recuperação judicial. A medida vem em meio a um cenário de crescente inadimplência e à piora dos resultados financeiros da instituição, que registrou o menor lucro em quase cinco anos.
Felipe Prince, diretor de riscos do banco, afirmou que a recuperação judicial “é uma armadilha para o produtor, pois corta o acesso ao crédito e inviabiliza a próxima safra”. Segundo o executivo, quem optar por esse caminho “não terá crédito hoje, amanhã nem nunca mais”.
Cresce o número de produtores em recuperação judicial
De acordo com dados divulgados pelo próprio banco, cerca de R$ 5,4 bilhões em empréstimos estão parados por conta de 808 pedidos de recuperação judicial feitos por produtores rurais. O número representa uma pequena fração dos 1 milhão de clientes da instituição, mas já é suficiente para acender o sinal de alerta.
A inadimplência na carteira de crédito rural subiu para 3,5% em junho, um aumento de 2,2 pontos percentuais em relação ao ano anterior. Esse avanço contribuiu para reduzir o retorno sobre o patrimônio líquido do banco de 21,6% para 8,4%, comprometendo seu desempenho frente a outros grandes bancos.
Mudanças estruturais no crédito do agronegócio
Prince destacou que o setor passa por uma transformação sem precedentes. “Cerca de 75% dos produtores inadimplentes estão nessa situação pela primeira vez”, observou. A combinação de queda nos preços das commodities, juros elevados e eventos climáticos extremos criou um ambiente de forte pressão sobre o campo.
O fortalecimento do agronegócio nos últimos anos atraiu novos agentes financeiros, como os Fiagros, fundos que investem em recebíveis agrícolas. No entanto, o aumento da oferta de crédito acabou superalavancando muitos produtores, levando parte deles à insolvência.
Banco adota garantias mais rígidas e acelera cobrança
Para reduzir riscos, o Banco do Brasil substituiu as tradicionais hipotecas pela alienação fiduciária, que mantém a propriedade das terras sob controle do banco até o pagamento integral da dívida. Essa mudança, embora mais segura para a instituição, encarece o crédito e torna o processo de liberação mais lento.
Além disso, o banco diminuiu o prazo para agir diante de atrasos: passou a contatar o produtor após 5 dias de inadimplência e pode recorrer à Justiça em 30 dias, contra até 180 anteriormente.
O uso de inteligência artificial também foi intensificado para classificar os clientes conforme sua capacidade de pagamento, permitindo decisões mais rápidas sobre concessão, renegociação ou suspensão de crédito.
Impactos no agronegócio e perspectivas para o setor
O endurecimento do crédito por parte do Banco do Brasil ocorre em um momento delicado para o agronegócio, um dos principais motores da economia brasileira. O banco detém cerca de 60% do crédito rural no país, boa parte com juros subsidiados, e sempre foi considerado um parceiro de longo prazo pelos produtores.
No entanto, com o aumento dos calotes e das ações de recuperação judicial, a instituição busca proteger seu balanço. Analistas do Itaú BBA e do Citigroup preveem que o terceiro trimestre será o mais desafiador do ano para o Banco do Brasil, e que o impacto da crise no campo deve se estender para 2025.
Mesmo com o lançamento de programas de renegociação de dívidas pelo governo federal, a adesão ainda é incerta. A efetividade dessas medidas será um indicador importante para o futuro do crédito rural brasileiro.
Um novo cenário para o crédito agrícola no Brasil
O relacionamento entre produtores e o Banco do Brasil passa por uma mudança de paradigma. A antiga postura flexível e de renegociação constante dá lugar a uma estratégia mais técnica e rigorosa. Segundo Prince, o banco segue aberto ao diálogo, mas deixa claro um limite: “não existe dívida que não possa ser negociada, exceto a de quem pede recuperação judicial.”







